Mortes ocorridas após supostos confrontos entre policiais militares e cidadãos ganharam destaque nas estatísticas do estado de São Paulo e marcaram histórias de famílias destruídas pela violência. O aposentado Dorival Tavares da Silva viu uma coincidência dolorosa em meio aos casos: 17 dias após seu filho Ricardo ser assassinado por policiais no bairro da Vila Dalva, ele acompanhou pela TV as investigações sobre a execução de outra vítima, também de nome Ricardo. “Toda vez que via me dava mais raiva. Pensava: 'eles fizeram isso com meu filho e continuam fazendo?'”, disse Dorival em entrevista ao G1.
Ele se referia ao caso do empresário Ricardo Prudente de Aquino, morto em 18 de julho por policiais no bairro de Pinheiros, em São Paulo, após uma abordagem. Nos dois casos, quem disparou foi a polícia. Nos dois casos, nenhum deles tinha ficha criminal. Nos dois casos, a alegação foi resistência à prisão.
Entre abril e junho de 2012, 79 pessoas foram mortas por policiais em serviço na capital. Ao comentar a morte de um italiano após um assalto em São Paulo, o secretário da Segurança Pública, Antônio Ferreira Pinto, disse que a cidade vive uma 'escalada de violência'.
O total de homicídios dolosos (quando há a intenção de matar) cresceu 21% na cidade de São Paulo e 8,39% no estado no primeiro semestre de 2012, de acordo com as estatísticas da Secretaria da Segurança Pública. O governador Geraldo Alckmin atribuiu o crescimento do índice à reação de criminosos ao aumento da repressão policial ao tráfico de drogas em São Paulo, e disse que o estado enfrenta "meses difíceis".
A vida sem Ricardo
O aposentado Dorival Tavares conta que também ajudou nas investigações que desmontaram a versão dos policiais para a morte do filho. Ao lado de Daniel de Oliveira, pai do garoto que foi morto com Ricardo quando andavam juntos de moto, o aposentado se empenhou em recolher provas e informações que fizeram com que cinco policiais militares envolvidos no caso fossem presos. “Desde o começo Daniel disse que ia provar que eles eram inocentes. Eu ajudei nas investigações”, conta ele.
Na casa simples de dois quartos em Vargem Grande Paulista, na Grande São Paulo, Dorival tenta retomar a vida sem o seu Ricardo. Nascido quando o pai estava para se aposentar, o menino passou a infância ao lado de Dorival, já que a mãe trabalhava o dia todo fora de casa, como doméstica. “Ele ia para onde eu ia, desde criança tomei conta dele. Carregava até mamadeira dentro do carro.”
Ricardo nasceu e morreu em um dia 1º, coincidência que convive com as memórias do aposentado. "O sonho dele era trabalhar, ganhar dinheiro, comprar um carro. Ele adorava carro, moto. Eles morreram no que estavam querendo. O prazer deles era andar de moto."
O pai conta que Ricardo terminou o primeiro grau e fez curso técnico de administração para tentar um emprego melhor do que o de repositor num supermercado, onde estava atualmente. "Ele era inteligente, o meu filho", lembra Dorival emocionado, mostrando fotos e pertences do jovem de 20 anos. "Nunca fui chamado aqui para ir atrás dele, em delegacia, nunca deu trabalho."
'Um dia ele saiu e não voltou'
Na madrugada daquele 1º de julho, Dorival recebeu um telefonema. "Ligaram procurando a família do César [amigo de infância de Ricardo] para dizer que ele estava no hospital. Fui na casa do Daniel [pai de César], mas ele não chegava. Na hora eu nem me toquei que o meu estava junto. Chegamos no hospital umas 7h e pouco e o pai dele disse: 'Seu Dorival do céu, a polícia matou meu filho e o seu ainda está vivo, mas não sabe se escapa'."
Dorival chegou a ver Ricardo, mas ele estava inconsciente e morreu na mesma tarde. "Fiquei sabendo que ele reagiu ainda no hospital e falou: 'A polícia que matou nós. Matou meu amigo e eu estou aqui' e aí caiu em coma de novo."
O boletim de ocorrência da morte foi registrado no 51º Distrito Policial, no Rio Pequeno, e o caso foi depois encaminhado ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), por envolver policiais militares em serviço.
No boletim, o registro aparece como resistência seguida de morte, e aponta a apreensão de três armas com as vítimas. Dorival diz que as armas "apareceram" depois - uma delas oito dias após os crimes. "E não tinha nenhuma detonada."
Na descrição do incidente, os policiais afirmam que estavam em patrulhamento de rotina quando perceberam uma moto com duas pessoas em comportamento suspeito. Fizeram sinal luminoso, mas o motorista não obedeceu e fugiu. Teria havido troca de tiros, e a moto caiu.
"Nós pensamos que tinha sido acidente de moto. Mas a filha do Daniel foi até o lugar e ligou dizendo: 'pai, vem aqui que não foi acidente de moto'. Quando Daniel chegou lá, viu um policial desmontando a moto que estava inteirinha, sem nenhum arranhão". Dorival conta que os policiais estavam em um carro particular, não identificado, e que eles atiraram para cima pra justificar um suposto tiroteio.
Daniel decidiu investigar as mortes e reuniu, com a ajuda de Dorival, testemunhas, evidências e provas que contestam a versão dos PMs. Na semana passada, cinco policiais foram presos. Daniel e Dorival se dizem aliviados com as prisões. "Graças a Deus a gente conseguiu", disse o pai de César.
A Corregedoria da Polícia Militar disse, em nota divulgada sobre o caso, que não compactua com qualquer tipo de irregularidade praticada por PMs. Os cinco policiais presos são do 14º Batalhão de Osasco e não tinham autorização para atuar na capital paulista. O Ministério Público vai denunciar os suspeitos por duplo homicídio qualificado.
"É triste para um pai, uma mãe... Você trabalha tanto para criar um filho e ele morre nessa situação. Eles foram enterrados como bandidos. Não entra na minha cabeça", diz Dorival.
Ele se referia ao caso do empresário Ricardo Prudente de Aquino, morto em 18 de julho por policiais no bairro de Pinheiros, em São Paulo, após uma abordagem. Nos dois casos, quem disparou foi a polícia. Nos dois casos, nenhum deles tinha ficha criminal. Nos dois casos, a alegação foi resistência à prisão.
Entre abril e junho de 2012, 79 pessoas foram mortas por policiais em serviço na capital. Ao comentar a morte de um italiano após um assalto em São Paulo, o secretário da Segurança Pública, Antônio Ferreira Pinto, disse que a cidade vive uma 'escalada de violência'.
O total de homicídios dolosos (quando há a intenção de matar) cresceu 21% na cidade de São Paulo e 8,39% no estado no primeiro semestre de 2012, de acordo com as estatísticas da Secretaria da Segurança Pública. O governador Geraldo Alckmin atribuiu o crescimento do índice à reação de criminosos ao aumento da repressão policial ao tráfico de drogas em São Paulo, e disse que o estado enfrenta "meses difíceis".
A vida sem Ricardo
O aposentado Dorival Tavares conta que também ajudou nas investigações que desmontaram a versão dos policiais para a morte do filho. Ao lado de Daniel de Oliveira, pai do garoto que foi morto com Ricardo quando andavam juntos de moto, o aposentado se empenhou em recolher provas e informações que fizeram com que cinco policiais militares envolvidos no caso fossem presos. “Desde o começo Daniel disse que ia provar que eles eram inocentes. Eu ajudei nas investigações”, conta ele.
Na casa simples de dois quartos em Vargem Grande Paulista, na Grande São Paulo, Dorival tenta retomar a vida sem o seu Ricardo. Nascido quando o pai estava para se aposentar, o menino passou a infância ao lado de Dorival, já que a mãe trabalhava o dia todo fora de casa, como doméstica. “Ele ia para onde eu ia, desde criança tomei conta dele. Carregava até mamadeira dentro do carro.”
Ricardo nasceu e morreu em um dia 1º, coincidência que convive com as memórias do aposentado. "O sonho dele era trabalhar, ganhar dinheiro, comprar um carro. Ele adorava carro, moto. Eles morreram no que estavam querendo. O prazer deles era andar de moto."
O pai conta que Ricardo terminou o primeiro grau e fez curso técnico de administração para tentar um emprego melhor do que o de repositor num supermercado, onde estava atualmente. "Ele era inteligente, o meu filho", lembra Dorival emocionado, mostrando fotos e pertences do jovem de 20 anos. "Nunca fui chamado aqui para ir atrás dele, em delegacia, nunca deu trabalho."
'Um dia ele saiu e não voltou'
Na madrugada daquele 1º de julho, Dorival recebeu um telefonema. "Ligaram procurando a família do César [amigo de infância de Ricardo] para dizer que ele estava no hospital. Fui na casa do Daniel [pai de César], mas ele não chegava. Na hora eu nem me toquei que o meu estava junto. Chegamos no hospital umas 7h e pouco e o pai dele disse: 'Seu Dorival do céu, a polícia matou meu filho e o seu ainda está vivo, mas não sabe se escapa'."
Dorival chegou a ver Ricardo, mas ele estava inconsciente e morreu na mesma tarde. "Fiquei sabendo que ele reagiu ainda no hospital e falou: 'A polícia que matou nós. Matou meu amigo e eu estou aqui' e aí caiu em coma de novo."
O boletim de ocorrência da morte foi registrado no 51º Distrito Policial, no Rio Pequeno, e o caso foi depois encaminhado ao Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), por envolver policiais militares em serviço.
No boletim, o registro aparece como resistência seguida de morte, e aponta a apreensão de três armas com as vítimas. Dorival diz que as armas "apareceram" depois - uma delas oito dias após os crimes. "E não tinha nenhuma detonada."
Na descrição do incidente, os policiais afirmam que estavam em patrulhamento de rotina quando perceberam uma moto com duas pessoas em comportamento suspeito. Fizeram sinal luminoso, mas o motorista não obedeceu e fugiu. Teria havido troca de tiros, e a moto caiu.
"Nós pensamos que tinha sido acidente de moto. Mas a filha do Daniel foi até o lugar e ligou dizendo: 'pai, vem aqui que não foi acidente de moto'. Quando Daniel chegou lá, viu um policial desmontando a moto que estava inteirinha, sem nenhum arranhão". Dorival conta que os policiais estavam em um carro particular, não identificado, e que eles atiraram para cima pra justificar um suposto tiroteio.
Daniel decidiu investigar as mortes e reuniu, com a ajuda de Dorival, testemunhas, evidências e provas que contestam a versão dos PMs. Na semana passada, cinco policiais foram presos. Daniel e Dorival se dizem aliviados com as prisões. "Graças a Deus a gente conseguiu", disse o pai de César.
A Corregedoria da Polícia Militar disse, em nota divulgada sobre o caso, que não compactua com qualquer tipo de irregularidade praticada por PMs. Os cinco policiais presos são do 14º Batalhão de Osasco e não tinham autorização para atuar na capital paulista. O Ministério Público vai denunciar os suspeitos por duplo homicídio qualificado.
"É triste para um pai, uma mãe... Você trabalha tanto para criar um filho e ele morre nessa situação. Eles foram enterrados como bandidos. Não entra na minha cabeça", diz Dorival.
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